PGR e Avaliação de Riscos Ocupacionais: o Que é e o Que NÃO Fazer.

A nova versão da NR-1, que estabeleceu o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), causou um grande impacto no universo prevencionista.

Afinal, esse novo “P” chega com a expectativa de unificar os programas previstos nas demais NRs (com exceção da 7) e, em teoria, “desburocratizar” a prática da SST.

A norma, no entanto, não é de fácil aplicação. 

E entre muitos itens complexos, um se destaca: o 1.5.4.4, que trata da Avaliação de Riscos Ocupacionais.

Então, inaugurando nossas discussões sobre o PGR, vamos conversar sobre o que NÃO fazer nesse item.

Ao final do artigo, indico algumas referências para você continuar a estudar o assunto e não ficar nas mãos de ninguém – muito menos nas minhas. 😉

Mas, antes de apresentar as armadilhas que estão sendo colocadas diante de nós nesse momento, vamos apresentar, rapidamente, algumas definições sobre avaliação de riscos.

Resumidamente: o que é a avaliação de riscos ocupacionais prevista no PGR?

O processo de avaliação de riscos ocupacionais tem por finalidade gerar subsídios para a tomada de decisão quanto a medidas de controle (ou de prevenção, termo usado pela norma).

A normatização britânica que trata do tema é muito feliz ao dizer que o processo de avaliação dos riscos, feito pelo empregador, deverá ser adequado e suficiente.

http://www.legislation.gov.uk/uksi/1999/3242/made/data.pdf

Afinal, s.m.j., a forma pela qual essa avaliação será realizada pertence ao domínio da técnica, e não ao de um regulamento de caráter geral. 😉

Na falta de um glossário que contemple esses itens na nossa NR-1, usamos as definições da ABNT (ABNT NBR ISO 31000 – Gestão de Riscos – DiretrizesABNT ISO Guia 73 – Gestão de Riscos – Vocabulário). Temos o seguinte cenário: 

Recomendo a leitura das duas referências. 

Devemos sempre lembrar que não é papel da NR suprir a falta de conhecimento técnico de nenhum de nós. Ninguém vira especialista em máquinas só por ler a NR-12, nem em Higiene Ocupacional lendo a NR-9…

Da mesma forma, ninguém vai aprender gerenciamento de riscos lendo a NR-1

Mas, talvez por receio de deixar as coisas muito vagas, a NR-1 avança um pouco no domínio da técnica ao estabelecer algumas diretrizes. 

Associando a imagem anterior aos respectivos itens do PGR, temos:

Processo de Avaliação de Riscos Ocupacionais: o Que NÃO Fazer.

Nesses primeiros meses de publicação da NR-1, já conseguimos ver muitas armadilhas sendo colocadas diante dos prevencionistas.

Muitos colegas já estão tentando implementar seus PGR e fazer seus Inventários de Riscos Ocupacionais.

Com base no relatório Good Practice and Pitfalls in Risk Assessment, elaborado pelo HSE, e no que já está sendo ventilado por aí, alertamos você para não cometer os seguintes erros:

  1. Tentar usar métodos quantitativos, às vezes bastante complicados, quando já existem boas práticas consolidadas ou soluções óbvias;
  2. Usar uma ferramenta ou técnica que não é adequada para aquela situação;
  3. Trabalhar sozinho, sendo que muitos processos exigem equipes multidisciplinares e a participação dos trabalhadores e da gerência;
  4. Usar uma ferramenta de avaliação de riscos apenas para justificar uma decisão que já foi tomada;
  5. Usar uma avaliação genérica, talvez até um modelo que recebeu de alguém, sem considerar as peculiaridades do local de trabalho avaliado.

Vamos comentar, rapidamente, um a um:

  1. Tentar usar métodos quantitativos ou complexos, quando já existem soluções consolidadas e/ou óbvias.

Essa é uma falha que já encontramos antes ainda da vigência do PGR.

Isso já era um problema, por exemplo, quando as empresas faziam avaliações quantitativas de exposição a agentes químicos (em geral de péssima qualidade) em situações de risco evidente.

Era o caso das atividades de soldagem, por exemplo, já que os fumos de solda são comprovadamente cancerígenos para humanos.

Nesse caso, em que há um risco evidente e a solução já é conhecida, não é preciso avaliação prévia. É preciso resolver a situação!

A NR-1 apresenta esse atalho para uma solução rápida ao criar o “Levantamento Preliminar de Perigos”, antecedendo o processo de Identificação de Perigos e o de Avaliação de Riscos Ocupacionais.

É mais fácil entender esse item ao considerar a NR-1 junto com a nova NR-9, primeira entre as NRs a ser publicada harmonizada com o PGR.

O item 9.4.1 da nova redação da NR-9 diz que:

9.4.1 Deve ser realizada análise preliminar das atividades de trabalho e dos dados já disponíveis relativos aos agentes físicos, químicos e biológicos, a fim de determinar a necessidade de adoção direta de medidas de prevenção ou de realização de avaliações qualitativas ou, quando aplicáveis, de avaliações quantitativas.

A ideia do levantamento preliminar de perigos, s.m.j., é justamente “peneirar” situações que sejam mais simples ou onde o risco seja óbvio e com solução direta – como no caso já citado das atividades de soldagem. 😉

Então, se você já identificou um risco evidente e que pode ser solucionado, não precisa passar por todo o complexo (e caro!) processo de avaliação de riscos antes de resolver a situação.

Atue logo!

2. Usar uma ferramenta ou técnica que não é adequada para aquela situação.

Esse assunto é complexo e não nos aprofundaremos nele nesse momento, mas queremos alertar que escolher ferramentas ou técnicas inadequadas pode ser fatal.

Cito como exemplo uma observação do relatório Good practice and pitfalls in risk assessment sobre situações altamente perigosas. 

Nesses casos, o risco deveria ser estimado sem considerar o tempo de exposição dos indivíduos, ainda que este seja pequeno

Se isso não for observado, poderemos chegar em um ponto em que alguém classifique como “aceitável” um trabalhador sendo erguido no garfo de uma empilhadeira, desde que seja um evento “raro”…

Vale lembrar que, apesar de a NR-1 deixar a critério da organização a escolha da ferramenta ou técnica a ser utilizada para avaliação, ela também prevê que elas sejam adequadas ao risco ou circunstância (item 1.5.4.4.2.1).

3. Trabalhar sozinho.

Em um dos primeiros textos aqui nesse blog, comentamos sobre como é importante que o profissional de SST goste de conversar.

Para um processo de avaliação de riscos isso é particularmente importante.

Você terá que ouvir os trabalhadores, supervisores, gerentes, equipes de manutenção, outros colegas prevencionistas… Isso porque nenhum prevencionista detém todo o conhecimento associado à nossa área!

E isso não é nenhum demérito, pelo contrário. Reconhecer as nossas deficiências faz com que sejamos cautelosos e que procuremos mais fontes de pesquisa, que ouçamos mais gente, para que assim nosso trabalho seja mais completo.

Então, não tenha constrangimento e explique ao seu contratante que a elaboração do PGR não será, simplesmente, você ir na empresa uma vez e depois entregar um monte de papeis como resultado. 

A participação de todos os envolvidos é fundamental para que a avaliação seja bem feita, as medidas de controle consideradas necessárias sejam adotadas e o PGR seja efetivamente um programa.

4. Usar uma ferramenta de avaliação de riscos apenas para justificar uma decisão que já foi tomada.

Em geral, esse erro será cometido por quem não quer adotar nenhuma medida de controle dos riscos, mas quer dar um certo ar de “tecnicidade” a essa decisão.

Tanto apoiar-se em premissas falsas quanto usar ferramentas ou técnicas de avaliação inadequadas pode conduzir a um resultado que não condiz com a realidade.

Sobre isso, vale lembrar novamente que o item 1.5.4.4.2.1 prevê que as ferramentas e técnicas de avaliação de riscos devem ser adequadas ao risco ou circunstância em avaliação. 😉

5. Usar uma avaliação completamente genérica, sem considerar as peculiaridades do local avaliado.

Não tenho bola de cristal, mas quase 15 anos de auditoria me fazem crer que esse erro deverá ser um dos campeões…

A gestão de riscos eficaz, segundo a NBR 31000, deve ser personalizada, inclusiva e dinâmica, além de levar em conta fatores humanos e culturais e facilitar a melhoria contínua da organização.

Nada disso se consegue ao simplesmente copiar um modelo que alguém disponibilizou.

Aqui, corremos o risco de continuar na indústria do papel, sem nenhum ganho real aos locais de trabalho.

E agora?

Sabemos que apenas colocamos a ponta do nosso pé na água do gerenciamento de riscos. Mas, ao menos, espero que tenha ficado claro que:

  • Realizar avaliação de riscos é uma tarefa complexa e de alta responsabilidade;
  • Todos teremos que estudar MUITO nos próximos anos. 😉

E um lembrete: o objetivo de qualquer ação em SST deve ser “resolver o problema”, e não simplesmente gerar papel.

A prática é o que importa.

De que adianta usar uma ferramenta de avaliação super adequada, documentar tudo e não fazer nada do que for recomendado? 

Ou, pior ainda, gerar centenas de páginas que não dizem rigorosamente NADA e achar que “tem um PGR”?

Nada.

Esperamos em breve estar de volta com mais ideias sobre o PGR e, também, sobre a nova NR-9. 🙂

Façamos todos um bom trabalho!


Observações e Dicas:

  • Utilizamos, como tradução para “risk assessment“, o termo “processo de avaliação de riscos”, como definido no Guia 73. O que a NBR 31000 define como “avaliação de riscos” corresponderia, segundo o Guia 73, ao termo “risk evaluation“.
  • Se você quiser pesquisar bibliografia em língua inglesa, use os termos: risk assessment, risk evaluation, level of risk (ou risk level).

Cibele Flores

Engenheira Mecânica, Engenheira de Segurança do Trabalho, Mestre em Engenharia, Auditora Fiscal do Trabalho e professora em cursos de especialização.

2 Resultados

  1. AIRTON SILVA disse:

    Parabens, mais uma vez, Cibele. Airton

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