Avaliação Qualitativa: Control Banding e a ferramenta COSHH Essentials.
Todos sabemos da dificuldade de realizar avaliações de riscos químicos, especialmente em empresas de pequeno e médio porte.
Avaliações quantitativas representativas da exposição podem ter um custo alto, e as empresas têm recursos limitados. Não dá para gastar todo o orçamento da SST com as medições e não sobrar nada para implantar os controles necessários, certo?
Mas como realizar avaliações qualitativas sem cair no “achismo”?
Entre os caminhos possíveis, estão os métodos de bandas de controle (control banding), que são estratégias que agrupam os riscos dos ambientes de trabalho em categorias, com base nas informações sobre exposição e riscos associados.
E entre as ferramentas de control banding pioneiras está o COSHH Essentials, do Health and Safety Executive (HSE, Reino Unido). Você pode acessar gratuitamente aqui:
https://www.hse.gov.uk/coshh/essentials/index.htm
Nessa ferramenta, podemos seguir dois caminhos:
- Consultar as fichas de controle para atividades comuns em diversas indústrias (acesse aqui). Essas fichas já trazem a medida de controle a ser adotada em soldagem, alguns trabalhos com sílica e muitas outras atividades na indústria, comércio, gráficas, marcenarias etc;
- Se a atividade não estiver entre as que têm fichas de controle, o COSHH Essentials traz uma ferramenta para a avaliação dos riscos, em uma tela inicial como essa aqui:
Ferramenta para Avaliação dos Riscos – COSHH Essentials
Para usar uma ferramenta de avaliação, é preciso entender os conceitos por trás dela. Eles estão apresentados nessa publicação aqui:
https://www.hse.gov.uk/pubns/guidance/coshh-technical-basis.pdf
Mas, para dar uma ideia geral e motivar você a estudar essa ferramenta, vamos fazer um resumo. 😉
A avaliação no COSHH Essentials, assim como na maioria das ferramentas de control banding, é baseada na seguinte lógica:
Veja que essa avaliação leva em consideração o risco à saúde e o potencial de exposição aos produtos utilizados no processo.
Em outras palavras, combina severidade do dano e probabilidade de sua ocorrência.
Severidade do Dano:
Para se avaliar os riscos à saúde, utilizam-se as frases H (hazard statements, conforme determinado pelo GHS). Os riscos potenciais à saúde são agrupados em cinco faixas, conforme apresentado na tabela a seguir.
Um alerta: esse método de avaliação não foi concebido para ser um modelo de exposição, e sim para permitir a identificação de abordagens de controle adequadas.
É um conceito parecido com o dos Limites de Exposição Ocupacional Baseados na Performance (PB-OELs) utilizados na indústria farmacêutica, que também categorizam os compostos com base nos riscos a eles associados.
Probabilidade de Ocorrência do Dano – Potencial de Exposição:
Após avaliar os perigos à saúde, é necessário avaliar o potencial de exposição, que está relacionado à capacidade de a substância se propagar na atmosfera e às quantidades utilizadas.
Para os líquidos, a capacidade de propagação na atmosfera está relacionada à sua volatidade.
É preciso conhecer o ponto de ebulição da substância e a temperatura do processo, para então determinar se a volatilidade é considerada baixa, média ou alta, conforme figura a seguir.
A volatilidade pode também ser determinada a partir da pressão de vapor, utilizando a relação apresentada na tabela a seguir.
Volatilidade | Pressão de Vapor (Pa) |
Baixa | Menor que 500 |
Média | 500 a 25000 |
Alta | Maior que 25000 |
Já para os sólidos, a capacidade de propagação está associada ao empoeiramento, conforme a tabela a seguir.
Empoeiramento | Característica do Sólido |
Baixo | Escamas grandes ou grânulos grossos |
Médio | Sólidos granulares e cristalinos |
Alto | Poeiras finas e leves |
A quantidade de material utilizado pode ser enquadrada nas bandas apresentadas na seguinte tabela.
Sólidos | Líquidos | |
Pequena | Gramas | Mililitros |
Média | Kilogramas | Litros |
Grande | Toneladas | Metros cúbicos |
As tabelas foram adaptadas do HSE e da publicação Avaliação Qualitativa de Riscos Químicos, da Fundacentro.
Qual o Controle Necessário?
Combinando os grupos de risco (A, B, C, D ou E) e o potencial de exposição, podemos determinar a abordagem de controle pertinente.
A relação entre esses fatores é apresentada na figura a seguir, onde:
- Cada quadrante representa um grupo de risco;
- Os círculos internos representam as quantidades usadas (interno: quantidades pequenas; intermediário: qtdades médias; externo: grandes quantidades);
- Cada fatia do quadrante representa a volatilidade ou o empoeiramento: alto, médio ou baixo (A, M, B).
O cruzamento dessas informações dará um número de 1 a 4, que corresponde à abordagem de controle a ser adotada.
O método do COSHH Essentials estabelece quatro ações de controle possíveis, conforme a tabela a seguir, também adaptada do HSE.
Abordagem de Controle | Tipo | Eficácia relativa | Descrição geral |
1 | Ventilação geral | 1 | Um bom padrão de ventilação geral e boas práticas de trabalho. |
2 | Medidas de engenharia | Redução de 10 vezes | Ventilação local exaustora, com captores e coifas bem posicionados. |
3 | Enclausuramento | Redução de 100 vezes | Enclausuramento ou confinamento do processo. |
4 | Especial | – | Buscar assessoria especializada para selecionar as medidas de controle adequadas. |
Observe que, na abordagem de controle 4, o usuário é orientado a buscar um especialista.
O especialista, nessas situações mais delicadas, deverá realizar uma avaliação mais aprofundada – o que poderá envolver avaliações quantitativas.
Mas, nesse caminho, muitos riscos menores já foram filtrados, reduzindo a quantidade de avaliações necessárias e ajudando a focar nas situações que tenham um potencial de dano maior.
Pode usar o COSHH Essentials para tudo?
Infelizmente, não.
Como qualquer ferramenta, o COSHH Essentials tem limitações. Algumas delas:
- Ela se aplica apenas a líquidos e sólidos, não sendo aplicável a gases e a líquidos acima do ponto de ebulição.
- A duração da exposição não é incluída no roteiro da avaliação, havendo, porém, um filtro para atividades com duração inferior a 15 minutos por dia.
Também vale ressaltar que as substâncias que podem provocar efeitos nocivos quando em contato com os olhos e a pele são enquadradas no grupo de perigo à saúde S.
Isso indica a necessidade de adoção de medidas de controle adicionais, apresentadas em fichas de controle específicas.
E agora?
O COSHH Essentials pode ser usado como uma ferramenta de apoio no gerenciamento de riscos ocupacionais do estabelecimento.
Ela pode ser especialmente útil:
- Em situações simples, com manipulação de poucos produtos, especialmente sólidos;
- Quando nos deparamos com produtos químicos que não conhecemos. Essa combinação entre frases H da FISPQ, quantidades usadas e volatilidade/empoeiramento é muito poderosa para nos ajudar a entender o que seria necessário naquela situação.
- Quando encontramos produtos para os quais não há limites de exposição estabelecidos. Afinal, nesse caso, para quê medir?
Estude a ferramenta e tente aplicá-la em alguns postos de trabalho… Em algum momento ela poderá ser útil!
Façamos todos um bom trabalho!
Referências:
Esse post foi baseado em um dos capítulos do Estudo de Caso desenvolvido por mim na conclusão do curso de Higiene Ocupacional na USP.
As referências usadas nesse post, e que podem ser consultadas para aprofundamento do seu estudo, são as seguintes:
- ADDER, A.W.; FARRIS, J.P.; KU, R.H. Occupational health categorization and compound handling practice systems – roots, application and future.
- COLASSO, C. Abordagem pragmática para Avaliação Qualitativa de Risco Químico. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 4, n. 3, p. 8-19, out. 2011.
- FUNDACENTRO. Avaliação Qualitativa de Riscos Químicos: Orientações Básicas para o Controle da Exposição a Produtos Químicos. Brasil, 2012.
- HEALTH AND SAFETY EXECUTIVE (HSE). The Technical Basis for COSHH Essentials: Easy Steps to Control Chemicals. Bootle, 2017.
http://www.hse.gov.uk/pubns/guidance/coshh-technical-basis.pdf
- NATIONAL INSTITUTE FOR OCCUPATIONAL SAFETY AND HEALTH (NIOSH). Qualitative Risk Characterization and Management of Occupational Hazards: Control Banding (CB). Washington, 2009.
https://www.cdc.gov/niosh/docs/2009-152/
Bons estudos!
Cibele: parabéns por mais um material de altissima qualidade e senso prático. Ressalto que o texto que deverá entrar em consulta pública do Anexo de Químicos da NR-9 inclui a possibilidade de utilização de métodos qualitativos. O pessoal das perícias não vai gostar muito, mas… Saudações mineiras. Airton
Bom dia Cibele e parabéns por mais um excelente artigo!
Neste contexto da inexistência de limites de tolerância, você teria algum material sobre defensivos agrícolas para sugerir como fonte de consulta?
Seria interessante conteúdo que orientasse sobre detalhes de boas práticas e caminhos qualitativos.