Acidentes de Trabalho: Indo Além do “Ato Inseguro”

Entre os temas mais presentes no universo prevencionista, destacam-se os acidentes de trabalho. Além do óbvio sofrimento dos acidentados e de suas famílias, temos também prejuízos ao INSS (através de auxílios e pensões) e às empresas.

Quando temos um acidente de trabalho, é fundamental realizar uma boa análise. Mas onde isso está previsto? Onde muitos prevencionistas erram na avaliação? O resultado da análise pode ser “ato inseguro”?

A análise dos acidentes de trabalho é obrigatória?

Segundo a nova NR-1, vigente a partir de janeiro de 2022, as empresas têm a obrigação de analisar os acidentes e as doenças relacionadas ao trabalho (item 1.5.5.5.1).

No entanto, o que se observa é que a maioria dos acidentes de trabalho é analisada de forma equivocada pelos técnicos e engenheiros de segurança do trabalho, e infelizmente até por auditores fiscais, peritos judiciais e outros profissionais da área.

Infelizmente, muitos ainda têm uma visão antiga, que insiste em culpar o trabalhador por atos inseguros. Essa visão, além de superficial, favorece a ocorrência de novos acidentes, já que as causas-raízes acabam por não ser identificadas e tratadas.

É comum encontrar relatórios de análise de acidente de trabalho com expressões como “o trabalhador distraiu-se”, “descuidadamente”, “não seguiu o procedimento previsto pela empresa”…

Causas que vão além do “ato inseguro”

Em geral, mesmo as análises de acidentes que vão além do “ato inseguro” limitam-se a abordar apenas aspectos mais óbvios como falta de proteção contra quedas de altura, instalações elétricas inadequadas ou coisas semelhantes.

No entanto, podemos e devemos ir além:

  • Jornada de trabalho: submeter o trabalhador a jornadas excessivas comprovadamente favorece a ocorrência de acidentes de trabalho.

Ainda que no dia do acidente o trabalhador não tenha completado a jornada, é fundamental ver os dias (e semanas) anteriores.

Excesso de jornada e falta de descanso comprometem o desempenho do trabalhador, além de prejudicarem seu convívio familiar.

  • Sinalização e isolamento: muitas vezes, acidentes ocorrem porque não havia sinalização adequada. Em alguns casos, seria possível até bloquear o acesso a áreas de risco.

Exemplo verídico: trabalhador veio a óbito porque entrou em uma moega (que era um espaço confinado), sem qualquer preparação. Isso aconteceu porque ele deixou cair algum objeto (não lembro qual), e quis buscar.

A análise da empresa, evidentemente, atribuiu culpa ao trabalhador por ter entrado em local não autorizado. No entanto, não havia sinalização, isolamento ou bloqueio da moega, contrariando o disposto no item 33.3.2 da NR-33…

  • Condições de segurança de máquinas e equipamentos: parece óbvio, mas infelizmente não é. Já tive a infelicidade de ler que um trabalhador que havia perdido um dedo em uma prensa de chaveta havia “descumprido procedimento da empresa”.

O tal procedimento era “não colocar os dedos na zona perigosa”!!!!!

E agora?

Durante o processo de análise, é fundamental conversar com o acidentado, com seus colegas, com seus superiores… É realmente um trabalho investigativo que devemos realizar com muita seriedade e empenho.

A necessidade de aprofundar as investigações, de forma a obter informações úteis a partir da análise, também está expressa na nova NR-1. Ela estabelece, em seu item 1.5.5.5.2, que:

1.5.5.5.2 As análises de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho devem ser documentadas e:
a) considerar as situações geradoras dos eventos, levando em conta as atividades efetivamente desenvolvidas, ambiente de trabalho, materiais e organização da produção e do trabalho;
b) identificar os fatores relacionados com o evento; e
c) fornecer evidências para subsidiar e revisar as medidas de prevenção existentes.

E fica uma dica: nunca deixe de analisar os acidentes em que não houve danos físicos ou ao patrimônio. Afinal, as causas desses acidentes podem apontar problemas que, em algum momento, sejam capazes de causar ocorrências graves.

E outra dica (!): a expressão “ato inseguro” foi retirada da NR-01 em 2009.


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E como a vida não é apenas SST, compartilho o que tenho lido de bom no momento…

Façamos todos um bom trabalho!

Cibele Flores

Engenheira Mecânica, Engenheira de Segurança do Trabalho, Mestre em Engenharia, Auditora Fiscal do Trabalho e professora em cursos de especialização.

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